IDEOLOGIA: EU QUERO UMA PRA VIVER?

Por Fernando R. F. de Lima.
            Depois do surpreendente resultado da eleição de 05 de outubro de 2014, que contrariou boa parte das pesquisas prévias mas, acima de tudo, mostrou uma virada inédita na história das eleições para vários candidatos, uma questão se coloca: qual o grau de ideologização ou fidelidade partidária dos brasileiros? Em momentos anteriores, a teoria vigente dizia que cerca de 1/3 dos eleitores era petista de carteirinha. Cerca de 1/3 dos eleitores, era anti-petista, e o restante decidia a eleição indo de acordo com o vento.
            A eleição atual, contudo, mostrou que o eleitor brasileiro não conecta partido com candidato. Explico: no Paraná, a Dilma obteve 32,54% do votos válidos; Aécio Neves 49,79%; No plano estadual, Gleisi Hoffmann, do PT, teve apenas 14,87%, enquanto Beto Richa foi reeleito com nada menos que 55,67% do total de votos. Isto significa que muitos dos eleitores de Dilma votaram em Beto Richa, fazendo a estranha combinação 13 e 45 na urna eletrônica. Quando analisamos do ponto de vista dos candidatos ao senado, a coisa fica mais nebulosa, porque Álvaro Dias (PSDB) obteve nada menos que 77% dos votos válidos.
            Em relação aos partidos, a situação no Paraná é mais confusa: o PMDB foi partido mais votado, obtendo 13,19% dos votos válidos, seguido pelo PT (11,95%), PSDB (9,34%), PP(9,21%) e PSC (8,71). No caso dos deputados estaduais, a sequência é outra: PSC (18,35%), PMDB (13,4%), PSDB (11,36%), PT (8,48%), PSD (6,26%) entre os mais votados. Isto significa que, estatisticamente, é provável que um eleitor tenha votado em um candidato de cada partido na eleição. Na verdade, com exceção de governador e senador, que obtiveram os maiores percentuais, o mais provável é que a maioria dos eleitores tenha votado em um candidato de cada partido do que em todos os candidatos do mesmo partido.
            Isto significa que as razões que levaram cerca de 60% do eleitorado brasileiro a rejeitar a presidANTA Dilma no primeiro turno é menos algum tipo de discordância ideológica e mais a discordância com os métodos de governo do PT, provavelmente causada pelo abuso da corrupção, da ambição desmedida na utilização das estatais em benefício próprio e no próprio desgaste que os 12 anos consecutivos de governo do PT sofrem no país, ainda mais mostrando tão pouco resultado. Isto porque, em São Paulo, o PSDB já atua há 24 anos e foi reeleito com notórios 57,31%, entregando ao mesmo partido o senado com 58,49% dos votos, aposentando Eduardo Suplicy (com sorte para sempre).
            Desta forma, o 2º turno presidencial mostra que há muito espaço para o crescimento de Aécio Neves, porque grande parte da população parece rejeitar o modus operandi do PT. No entanto, esta mudança de opção não parece guardar relação com ideologia alguma, assunto no qual o brasileiro não é exatamente coerente.
           
UMA NOTA SOBRE O SISTEMA POLÍTICO.
Como foi amplamente debatido no primeiro turno presidencial, acho que vale a pena tornar a discutir a questão do voto distrital e suas diferenças em relação ao sistema proporcional em lista aberta vigente hoje no Brasil. A grande maioria dos brasileiros ainda hoje não compreende como funciona o sistema de escolha de deputados, adotado desde 1988. Inclusive, isto causa muita indignação quando se vê alguns deputados conseguirem 80 mil votos e ficarem de fora enquanto outros conseguem uma vaga com metade desta votação.
No caso do Paraná, foram computados 5.665.222 votos válidos para deputados federais. O Paraná possui 30 cadeiras na câmara de deputados em Brasília, o que significa que para cada cadeira são necessários 188.841 votos. Levando em conta a votação bruta, apenas a deputada Christiane Yared do PTN seria eleita, porque ela foi a única que superou esta marca, atingindo 200.144 votos. A coligação dela, contudo, irá conseguir 6 vagas, porque totalizou 1.109.905. O último deputado a eleger nesta coligação recebeu apenas 71.822 votos, menos da metade do necessário. As legendas (partidos), receberam 90.263 votos, que contribuem para soma total. O nosso sistema chama-se lista aberta porque são chamados para ocupar as vagas os mais votados na ordem da coligação.
O nosso sistema eleitoral é, de certa forma, ruim, porque as coligações com mais candidatos são beneficiadas. Da mesma forma, aquelas que conseguem reunir puxadores de votos, ou seja, personalidades que cativam o público por alguma razão. No caso da deputada Yared, sua maior realização política foi ter sido vítima de uma tragédia pessoal, em que morreu seu filho, em um acidente automobilístico envolvendo um deputado estadual da família Carli. O que ela representa em termos ideológicos provavelmente não possui qualquer aderência ao programa político partidário do PTN, se é que o PTN tem um programa político partidário. Como senhora de classe média que é, talvez ela até se julgue uma pessoa “apolítica”, que não tem preferência por nenhuma ideologia. Mas divago.
A grande diferença do sistema proporcional para o sistema majoritário é que a maioria dos candidatos a deputado atualmente eleitos não o seriam num sistema majoritário. Isto porque o Estado do Paraná seria dividido em 30 distritos eleitorais proporcionais ao número de eleitores. Em cada distrito eleitoral, os partidos poderiam apresentar apenas um candidato, que disputaria uma eleição majoritária contra os outros candidatos assim como acontece como a eleição para governador, senador, prefeito e presidente.
Desta forma, acredito que os candidatos a deputado iriam se esforçar mais para vincular sua própria imagem a de outros candidatos majoritários mais conhecidos. Começando pelo prefeito, passando pelo senador, governador e presidente. Seria um modo de incutir no eleitor a fidelidade partidária. Um distrito eleitoral é, numa cidade grande, um conjunto de bairros. No caso do Paraná o distrito seria uma aglomeração de aproximadamente 250 mil pessoas, agrupando entre 190 e 200 mil eleitores.  
Em Curitiba, com 1,8 milhões de habitantes, teríamos algo como 9 distritos. Cada um destes apresentaria um candidato por partido. Este teria que ser eleito, obrigatoriamente, com a maioria dos votos dali. Como no Brasil existem atualmente cerca de 37 partidos, esta tarefa não seria tão difícil no caso de uma eleição direta. Portanto, poderíamos adotar eleição em dois turnos para deputado, em que seria necessário fazer 50% mais 1 voto para se eleger no segundo turno, quando passariam apenas os dois mais votados. A França adota este sistema.
Posso adiantar, por uma rápida avaliação dos deputados, que boa parte dos  eleitos e reeleitos estaria fora da câmara federal por este sistema. A razão é simples: a maioria dos puxadores de votos tem votos espalhados por todo o Estado (a Yared é uma exceção, já que seus votos se concentram na capital). Num sistema distrital, dependeriam de seus vizinhos. Outra questão importante: muitos deputados hoje vivem em Curitiba, mas fazem campanha em todo o Estado ou em algumas regiões. No voto distrital, o deputado é necessariamente um representante daquela região. Não faria sentido algum ele viver em Curitiba e tentar a sorte no distrito de Foz do Iguaçu, por exemplo. O candidato estaria mais próximo do eleitor.

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