CONCORRÊNCIA PERFEITA: PORQUE ELA EXISTE
Por Fernando R. F. de Lima.
Para um
economista, o conceito de concorrência perfeita deve ser perfeita claro e
compreensível, não gerando qualquer tipo de dúvida na hora de se analisar os
mercados. No entanto, entre os geógrafos, meio ao qual pertenço, toda e
qualquer discussão que envolve economia em que apareça o conceito de
concorrência perfeita gera imediatamente sorrisinhos zombeteiros com o canto da
boca, como se isso fosse apenas o produto de uma mente delirante incapaz de
compreender que “O capital” sempre tem lucro.
No
entanto, num mercado competitivo, o normal é que as empresas acabem operando
numa situação de concorrência perfeita, assunto que, por sinal, já foi objeto
de análise neste blog em outros textos. No texto atual, tratarei do caso
particular do mercado de transporte de grãos, em especial do transporte
rodoviário de grãos, que nos últimos meses, tendo em vista algumas mudanças no
setor, conheceu uma redução de preço que chegou a 40% em algumas praças,
levando diversos operadores a trabalhar com prejuízo contábil.
Primeiro
ponto para compreender a ideia de concorrência perfeita, é compreender o
conceito de lucro econômico e lucro contábil. O lucro, grosso modo, pode ser
definido como a diferença entre a receita e a despesa da empresa. No entanto,
enquanto para apuração contábil são considerados apenas os custos explícitos,
isto é, os custos diretamente relacionados ao negócio (depreciação, salários,
insumos, aluguéis, juros, capital), na apuração econômica do resultado devem
ser considerados também os custos implícitos. Estes são os custos de
oportunidade do negócio. O Custo de oportunidade é aquele que você paga por não
utilizar seu dinheiro em outra atividade. Normalmente, a mais simples das atividades
comparativas é aplicar o próprio dinheiro em fundos do governo, que pagam algo
próximo a taxa de juros Selic.
Quando
analisamos mercados altamente competitivos, em que há inúmeros concorrentes,
como é o caso da oferta de frete de grãos, e ao mesmo tempo há inúmeros
compradores, que são os vendedores de grãos, nota-se que nenhum dos dois lados
é capaz de determinar o preço do produto (no caso o frete). Assim sendo, os
vendedores vão ofertar seus produtos tendo em vista seus custos básicos mais sua
expectativa de lucro. Digamos que para rodar 600 km um caminhoneiro tenha como
referência um custo de R$ 80,00 por tonelada transportada. Este valor será sua
referência para trabalhar na ora de ofertar seu preço. Se ele quiser um lucro
de 20%, seu preço será de R$ 96,00 por tonelada.
No
entanto, ele só poderá cobrar este preço se os outros caminhoneiros que estão
próximos a ele naquele momento cobrarem o mesmo preço ou menos. Eles deverão
ter mais ou menos o mesmo custo que ele por quilômetro rodado, porque os
equipamentos são similares, de modo que o que irá variar entre eles é a
expectativa de ganhos. Da mesma forma, a disposição do comprador em pagar este
preço irá variar de acordo com sua preço em despachar sua mercadoria; quando
maior o número de pessoas competindo pelo frete disponível, maior será a
disposição do comprador em aceitar o preço que lhe é oferecido sem barganhar.
Porque a oferta de transporte tende a se reduzir.
O que
acontece no mercado de frete de grãos, basicamente, é o seguinte: durante os
meses da safra, os produtores tem uma relativa pressa em despachar sua produção
para os portos. No entanto, como a oferta de caminhões é inelástica no curto
prazo, isto é, ela não cresce, o preço do frete aumenta nesta época e tende a
ficar acima dos custos básicos. Com isso, o transportador tem lucro, que as
vezes ultrapassa em 30% ou 40% os custos.
Na
entressafra, o produtor tem pouca pressa em oferecer seu produto no mercado,
normalmente por conta de uma maior restrição de oferta, por não ter produto, ou
por estar aguardando preços melhores. Com isso, tendo em vista a
impossibilidade de reduzir a oferta de caminhões, e o fato de que a frota
parada gera custos fixos do mesmo modo que rodando, os frete tende a cair de
preço, ficando muitas vezes abaixo dos custos, algumas vezes até 30% abaixo dos
custos. Com isso, o transportador opera com prejuízo, que só não é maior do que
ficar completamente parado, mas ainda assim com prejuízo econômico e contábil.
Quando avaliado ao longo do ano, o negócio de transporte de grãos mostrar-se
contabilmente lucrativo, ou as vezes apenas empata, não dando prejuízo. No
entanto, avaliado do ponto de vista econômico, ele não apresenta lucro algum.
Assim
sendo, firmas individuais podem até ter lucro no mercado de frete de grãos, por
conta de uma estrutura de custos mais enxuta, algum ganho de eficiência
operacional, ou sorte na hora da contratação dos fretes. No entanto, no cômputo
geral das empresas, o mercado de transportadores rodoviários de grãos, além de
extremamente competitivo, opera numa situação que economicamente é conhecida
como concorrência perfeita.
A
vantagem da concorrência perfeita em relação aos monopólios ou oligopólios
reside no fato de que, como estes empresas estão sempre operando no limite de
seus custos, isto exige delas uma grande capacidade de inovação e eficiência
para se manterem sempre competitivas. Apesar do Brasil ser extremamente
dependente do transporte rodoviário, que é muito mais caro em termos de custos
operacionais que o ferroviário ou hidroviário, ainda assim, nosso frete
rodoviário é mais barato que a média do frete rodoviário internacional. A razão
é a elevada competição no segmento, que apresenta no país grande produtividade.
Não é atoa que o Brasil é o quarto maior mercado de caminhões do mundo, e um
dos maiores fabricantes mundiais. Isso tudo apesar dos atropelos e trapalhadas
do governo federal.
As
empresas transportadoras do país seriam ainda mais eficientes, diversificando
inclusive no que diz respeito a modalidades de transporte, se a legislação
brasileira não fosse tão restritiva no que diz respeito a competição intermodal
e nossos mercados tão fechados à importação de equipamentos como navios,
trilhos, locomotivas e vagões.
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