EXISTIRÁ DE FATO A IDÉIA DE ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA? – Parte 1


EXISTIRÁ DE FATO A IDÉIA DE ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA? – Parte 1

Quando se fala do desenvolvimento urbano, há alguns personagens que sempre são mencionados, muitos deles considerados como verdadeiros vilões das mazelas urbanas. O chamado especulador, sobretudo o especulador imobiliário é tomado como o grande vilão das cidades no mundo todo, e a especulação imobiliária é tida como o grande mal a ser combatido nos centros urbanos. É pensando nos especuladores de imóveis que os agentes municipais criam leis como as de IPTU progressivo, ou as contribuições de melhorias. É também pensando nos especuladores que se aumentam os impostos e criam-se leis de verticalização que impulsionam a construção de edifícios com determinadas características.
Sendo um ator ao qual se dá tanta importância, creio ser necessário caracterizar o especulador imobiliário e suas atividades para que se possa justificar leis que combatam sua ação. De um modo geral, seguindo uma definição dicionarizada, podemos dizer que o especulador é:
1- que ou aquele que investiga, estuda, raciocina; estudioso, cientista;
2- investigador teórico de algum campo do conhecimento; pensador, teorizador, teórico;
3- que ou o que faz investimentos comerciais ou financeiros, visando obter lucros excepcionais de acordo com as flutuações do mercado;
4- que ou aquele que negocia de má-fé, enganando os outros ou se aproveitando da necessidade alheia, para obter lucros acima do aceitável; (Houaiss, http://dic.busca.uol.com.br/result.html?t=10&ref=homeuol&ad=on&q=especulador&group=0&x=0&y=0)
Escolhi o dicionário Houaiss porque ele é considerado o melhor dicionário da língua portuguesa. Os dois primeiros usos da palavra especulador, obviamente, não se aplicam ao tipo que queremos descrever. As duas últimas são as acepções que povoam a imaginação dos “fazedores” de leis contra a especulação imobiliária. A acepção 3 da palavra parece-me quase desprovida de sentido para a questão urbana. Porque no mercado de terra urbano praticamente inexistem flutuações de mercado que permitam lucros excepcionais. A baixa liquidez das operações com imóveis impedem este tipo de movimento, que caracteriza mais as operações em bolsa de valores. O 4 sentido da palavra, no entanto, vem de encontro com aquilo que imaginam as pessoas contra o especulador imobiliário. Pessoas que negociam de má-fé, aproveitando-se da necessidade alheia para fazer negócios e, ainda por cima, obtendo lucros acima do aceitável.
Esta definição exprime de forma ampla, e ao mesmo tempo absurda, a idéia de especulador. Porque o lucro daquele que negocia conosco será, dependendo da nossa disposição para fazer negócios, sempre acima do aceitável. O lucro, dependendo da pessoa, também será, sempre, algo inaceitável. Isto é, a idéia de lucro acima do aceitável não é um conceito, não é passível de definição, não é nada. É apenas uma opinião. Do mesmo modo a idéia de que negociar aproveitando-se de uma necessidade alheia é o mesmo que negociar de má-fé. Todo comerciante negocia algo visando suprir uma necessidade alheia, desde aquele que vende arroz para o pobre até o que vende jóias para o rico. A necessidade, assim como a utilidade, é algo inteiramente subjetivo.
A idéia, portanto, que norteia a visão do especulador imobiliário não é, sequer, uma noção dicionarizada. Baseia-se num preconceito sobre a atividade comercial, numa noção de que uma troca justa não envolver lucro. Não vou levar esta discussão para o tortuoso caminho teórico que justifica e apresenta esta idéia, porque as pessoas que acreditam que o lucro é malévolo em si não são dignas de debate, e as pessoas que não pensam desta forma são suficientemente inteligentes para compreender que o lucro não é, necessariamente, mal. E que, por fim, qualquer julgamento sobre isto é uma questão moral, portanto individual.
Mas se levarmos em consideração estas idéias, veremos que há leis sendo feitas tão somente com base em julgamentos morais dos planejadores ao invés de critérios técnicos que, supostamente, deveriam basear estas decisões. Afinal, há ou não há a especulação imobiliária nas cidades? Pode-se dizer que aquilo que se convencionou chamar de especulação imobiliária é, de fato, especulação?
A primeira questão a observar é que a prática atual de expansão das cidades leva, inevitavelmente, à valorização dos terrenos distantes do centro. Isto porque as cidades brasileiras têm seu crescimento e seu zoneamento amparado em duas idéias: a casa própria e o combate aos cortiços. Dada a complexidade do tema, vou dividir este artigo em duas ou três partes, de modo que agora faço uma pequena conclusão para voltar mais adiante.
Primeiramente, dada a definição de especular, as leis criadas com o intuito de combater a prática estão, por definição, equivocadas, porque um dos conceitos dicionarizados de “especulador” não se aplica ao mercado de imóveis, e o último, é apenas uma opinião e um preconceito sobre o modo de funcionamento da atividade comercial. Isto, contudo, não invalida por completo a idéia de que existam pessoas que realizam negócios de má-fé, ou contra o interesse coletivo utilizando-se do solo urbano como instrumento para enriquecimento e poder, manipulando o mercado de solo. Este será o tema do próximo texto deste blog.

Comentários

Anônimo disse…
Olá, acho que você está cometendo alguns equivocos em sua argumentação.

O primeiro é sair a partir da idéia da 'especulação imobiliária' mas analisar sob um ponto de vista individual: o especulador.

O segundo é buscar numa definição de dicionário (e na sua negação) algo que caracterize todas as complexidades da especulação imobiliária realmente existente (não o que as pessoas acham dela, ou o que o dicionário define).

Mas o terceiro ponto é muito mais importante: As leis que critica não são justificadas pela especulação imobiliária!

O IPTU progressivo no tempo vem para atenuar um problema indiscutível nos centros urbanos: A grande quantidade de imóveis vazios (em Curitiba são cerca de 60 mil). Vi em seus textos que critica a baixa densidade de algumas áreas urbanas, boa parte disto é causado pela não utilização de imóveis, guardados apenas como patrimônio.

Já a contribuição por melhoria, o próprio nome diz, se uma melhoria excepcional feita pela prefeitura (portanto pago com dinheiro de todos) valorizou o seu terreno. É justo que seja ressarcido. A não ser que a valorização não fosse excepcional e atingisse toda a cidade de forma homogênea, não há o que criticar.

Postagens mais visitadas deste blog

O PROBLEMA DO DÉFICIT HABITACIONAL - PARTE 2

O ELEITOR BRASILEIRO E O EFEITO MÚCIO

COMENTÁRIOS SOBRE O CENÁRIO ATUAL