COMPARANDO O PODER DE COMPRA EM DIFERENTES PAÍSES – A INFLUÊNCIA DA PRODUTIVIDADE DO TRABALHO.



 Por Fernando R. Ferro.

Uma conversa boba sobre preço de automóveis trouxe a questão da comparação do poder de compra entre um país e outro. No caso, o bem em pauta era um Suzuki Jimny, veículo vendido em mais de 180 países, o que facilita sobremaneira a comparação de preços. No Brasil, um desses custa ao redor de R$ 65 mil, enquanto na Inglaterra as por cerca de £14,5 mil, o que equivale a uns R$ 62 mil. Portanto, fugindo a alegação recorrente de que tudo no Brasil é mais caro, os preços estariam parelhos.
Mas o brasileiro, como se sabe, não desiste nunca: para provar que pagamos muito mais caro, alegou-se que aqui trabalha-se muito mais para conseguir R$ 65 mil do que na Inglaterra para obter £ 14,5 mil. Desta forma, o bem é relativamente mais barato lá do que aqui. Para tanto, devemos analisar essa informação de modo mais analítico. Porque na comparação direta – horas de trabalho vs remuneração – de fato trabalha-se menos lá que aqui para se obter o mesmo bem. Mas será isso verdade se considerarmos a produtividade do trabalho?
Roçada manual
Primeiramente, vou pedir para que comparem duas situações simples e cotidianas: a roçada da margem de uma rodovia. Em qualquer lugar onde cresça grama, a roçada do acostamento e canteiro central de rodovias será necessária. No Brasil, o método padrão consiste em empregar equipes de roçada, que consistem em 11[1] trabalhadores equipados com roçadeiras a gasolina que se deslocam a pé ao longo das áreas a serem roçadas. Uma equipe destas consegue cobrir cerca de 1200 metros quadrados por hora.
Por outro lado, imagine a roçada mecanizada, realizada por um trator. A equipe padrão é composta por 2 serventes, e 0,1 encarregados, ou seja, um encarregado para cada 10 equipes. A produtividade da roçada mecanizada é de 4000 metros quadrados por hora. Ou seja, no mesmo tempo, é possível produzir 3,33 vezes mais empregando 1/5 do número de trabalhadores. Cada trabalhador da roçada mecanizada produz, portanto, 16 vezes mais que um trabalhador da roçada manual. Isso significa, grosso modo, que ao longo de um ano de trabalho, o trabalhador da roçada mecanizada terá executado o trabalho equivalente a 16 anos de trabalho do trabalhador da roçada manual.
Roçada Mecanizada
Este é um exemplo banal. Agora imagine a mesma cena replicada em vários setores da economia: coleta de lixo, construção civil, agricultura, pecuária, pesca, transporte, etc. O resultado é que um ano de trabalho em um país com a produtividade da economia elevada, como é o caso dos EUA, equivale a vários anos de trabalho de um país como o Brasil. Apesar disso, a remuneração média de um trabalhador não será proporcionalmente mais elevada. Porque o emprego de mais capital torna o trabalho relativamente mais abundante, fazendo com que seu preço caia.
Assim, numa comparação direta, os salários na Europa e, principalmente, nos EUA e no Japão, deveriam ser ainda mais elevados do que o salário médio pago no Brasil, porque a produtividade nestes países é muito superior a nossa em praticamente todos os setores. A falta de mão de obra existe lá é parcialmente compensada com o emprego massivo de capital (ou seja, máquinas), o que faz com que cada trabalhador torne-se mais e mais produtivo.
Há outros ganhos de produtividade que advém não apenas do emprego de capital, mas também ganhos relacionados ao desenho e disposição dos objetos nas linhas de produção, mas também das cidades, portos, aeroportos e demais infraestruturas. Cidades planas, com ruas largas e bem pavimentadas favorecem o consumo de combustível, a eficiência energética, e influenciam positivamente a produtividade. Sistemas de transporte eficientes diminuem o tempo gasto em congestionamentos e também melhoram a produtividade.
Desta forma, o caminho que separa a pobreza brasileira da riqueza dos países europeus e principalmente dos EUA e Japão, está relacionado à baixa produtividade do trabalho no Brasil. Nosso poder de compra pode até parecer inferior ao de outros países, na comparação de nossa moeda com a deles, mas o fator determinante é que, pelo fato de trabalharmos de forma arcaica na maior parte dos setores, produzimos muito menos, e, portanto, recebemos uma remuneração menor por isso. Se isso não muda, não mudará nunca a relação entre os preços pagos e a quantidade de horas trabalhadas no país.


[1] Pela tabela de custos do DNIT, a equipe padrão consiste em 10 serventes e um encarregado. http://www.dnit.gov.br/download/servicos/sicro/manual-de-custos-rodoviarios/Volume5_Un_2003.pdf

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