SHORTINHO NA ESCOLA, FEMINISMO E LIBERDADE

Por Fernando Raphael Ferro de Lima.

            Um protesto de 300 meninas em Colégio na capital da república dos pampas, também conhecida como Porto Alegre, gerou, para minha surpresa, um monte de reações contrárias dentro de um grupo de “ateus” que participo no Facebook. A surpresa decorre do fato de que os indignados são pessoas que se revoltaram contra determinadas regras da sociedade, impostas sem questionamento, e de outras que defendem comportamentos criticados por ideologias religiosos, como o homossexualismo, casamento de pessoas do mesmo sexo, etc.
            No entanto, o ato das meninas que protestaram pelo direito de utilizar shorts na escola durante o verão foi taxado por muitos como algo esdrúxulo. Meninas de 13/14 anos foram taxadas de “aprendizes de feminazis”, “vagabundas”, entre outros termos ainda mais chulos. Muitos bradavam que o ambiente escolar não era adequado ao uso de shorts, entre muitas outras opiniões claramente fundamentadas apenas no preconceito pessoal contra  vestimenta de terceiros.
            Isso me lembrou outro episódio, ocorrido há alguns anos em uma faculdade privada em São Paulo, que foi comentado neste blog. É o caso da senhorita Geise Arruda, que ficou famosa depois de ser hostilizada por colegas por utilizar uma minissaia que, na opinião da multidão raivosa, era “muito curta e inadequada” para  ambiente acadêmico.
            Ambos os episódios, apesar de não relacionados, possuem muitas semelhanças e demonstram, sobretudo, a natureza autoritária e violenta dos brasileiros em relação ao comportamento de seus patrícios em ambientes públicos. Apesar de nossa aparente liberalidade de costumes, o brasileiro é um povo ainda muito conservador em diversos costumes, sobretudo no que diz respeito aos hábitos de vestimenta. Por exemplo, os formalismos exigidos em repartições públicas, especialmente pelo poder judiciário e legislativo, a preocupação exacerbada dos deputados com o “decoro”, mostram uma rigidez que se manifesta na exigência de que crianças e adolescentes vistam-se cobertos por inteiro em ambientes tropicais cuja temperatura no verão ultrapassa a marca dos 30ºC.
            Muitos, obviamente, argumentarão que o protesto das moças era injustificado visto que o colégio dispunha de ar condicionado nas salas de aula. No entanto, conforme comentei, a presença deste eletrodoméstico não se faz nos momentos de deslocamento, tampouco nas atividades físicas ao ar livre. De onde depreende-se que o desconforto causado aos alunos pela obrigatoriedade do uso de calças decorre única e exclusivamente pela exigência pudica de cobrir partes do corpo potencialmente eróticas.
            O argumento feminista, utilizado pelas meninas, obviamente plantado por professores, pais ou oportunistas, dada a complexidade do discurso incompatível com a maturidade intelectual das garotas, atribui a proibição ao machismo da sociedade. Mas o fato é que este “machismo” advém não somente dos homens, mas, sobretudo, das mulheres, que da mesma forma foram as primeiras a “agredir” verbalmente e quase fisicamente a senhorita Geise Arruda no episódio de anos atrás.
            Isso porque a pressão pelo controle do comportamento, sobretudo das crianças e adolescente, é muito grande. Uma senhora, no facebook, comentou categoricamente que “shorts são inadequados ao ambiente escolar”. Eu a questionei se havia algum embasamento científico ou estatístico correlacionando o uso de determinadas peças de roupa com o desempenho dos alunos. Até o presente momento, nenhuma manifestação contrária. Outros alegaram que o uniforme é importante para a disciplina. Mas as garotas não questionavam isso. Apenas pediam a incorporação de mais uma peça de vestimenta às autorizadas. Aqui entra, finalmente a última e conclusiva parte do texto.
Gostaria de comentar com os leitores as bizarrices que são facilmente encontradas num passeio ligeiro por qualquer loja de hipermercados em uma cidade estadunidense. Pessoas indo as compras vestindo pijamas, pantufas, e peças de roupas que facilmente passariam por roupas íntimas. Costumes semitransparentes ou tão colados ao corpo que visualmente apenas alteram a cor do que deveriam esconder. E estas pessoas, em momento algum são convidadas a se retirar dos ambientes onde se encontram.
Isso contrasta com a aparente formalidade e rigidez que imaginamos nos norte-americanos, em contraste com a sensualidade dos brasileiros. Porque, enquanto aqui as senhoras vão extremamente produzidas para um passeio na feira e senhores são barrados na entrada de boates por estarem portando bermudas, a condução dos assuntos públicos ocorre de forma absolutamente anárquica. A aparência, o formalismo parece ser a coisa mais importante. Cerceia-se a liberdade de vestimenta em favor de “dresscode” que transpareça seriedade, ética, honestidade, pureza e castidade. Já nosso grande irmão do norte pouco faz pela aparência dos seus cidadãos, ao mesmo tempo em pune severamente os desvios da lei que perturbem a ordem.
            Se a preocupação brasileira fosse de fato com o rendimento acadêmico dos alunos, com a segurança pública, ou com as condições de ensino aprendizado em sala de aula, acredito que os alunos seriam muito mais livres para usarem a vestimenta que bem entendessem em sala de aula. Porque independente da roupa, o que estaria em juízo seria a performance escolar. No entanto, mais importante que as notas, vale a roupa e as partes do corpo amostra. Então cerceia-se as alunas de usar shorts, o garotos do uso de bermudas ou regatas, em nome de uma aparência de ordem, enquanto no interior das salas de aula reina o caos.








            Acho sinceramente que as meninas estão no caminho certo em reunir-se para lutar por suas reivindicações, exigindo maior liberdade em um ambiente dominado por regras antiquadas como a escola. Há, sem dúvida, bandeiras mais importantes. Mas não deixa de ser pedagógica a ilustração de que crianças lutem pela liberdade, enquanto adultos revoltem-se contra a roupa que elas querem usar, ao mesmo tempo em que fecham os olhos para a corrupção devastadora no país. Tudo seguirá bem, desde que Dilma permanece de calças compridas ou saias longas, os deputados e ministros de paletó e gravata, e os juízos finjam que garantem a ordem e a justiça em suas togas. Eu creio que não. Por isso conclamo todos a irem, dia 13 de março às ruas. De shorts, de sunga, topless ou paletó. Mas ir a rua para lutar por mais liberdade, menos governo. Por mais responsabilidade e menos regras.

Link: http://democraciaeliberdade.blogspot.com.br/2009/11/microvestido-e-civilizacao.html

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