RESENHA - A EMERGÊNCIA SÓCIOAMBIENTAL – José Eli da Veiga. São Paulo: Ed. Senac-sp, 2007.

Por Fernando Raphael Ferro de Lima 

            Para aqueles que não conhecem, José Eli da Veiga é um conhecido economista da USP, principalmente por suas teses acerca da miragem da urbanização. Para ele o tamanho da população que merece ser chamada de urbana é muito menor que os 81% apontados pelo IBGE, rondando a casa dos 60% segundo suas estimativas. Neste livro editado pela editora SENAC de São Paulo, no entanto, o autor passa a fazer considerações sobre a questão do desenvolvimento sustentável e a chamada questão socioambiental, que por razões que ele explica no começo do livro é escrita sem o tradicional hífem.

            O primeiro capítulo do livro, escrito na forma de um ensaio para a divulgação científica, o autor faz um interessante passeio pelas críticas a atual metodologia de medição da riqueza, o PIB. Dentre as diversas críticas apontadas está a falha da não consideração da depreciação dos ativos, sobretudo dos ativos ambientais. A princípio parece haver outras justificativas para a crítica ao modelo de cálculo do PIB, no entanto o autor se restringe a questão da não consideração do passivo ambiental.

            Neste primeiro capítulo o autor também irá fazer algumas considerações sobre a idéia de desenvolvimento, onde ele irá apresentar algumas informações que são muito relevantes, ao menos ao meu ver. A principal questão é a de descolar a idéia de desenvolvimento da de crescimento econômico, onde ele mostra que mesmo com um crescimento econômico inferior o Brasil progrediu de 1980 para cá em outros indicadores de desenvolvimento, como o IDH da ONU e outros relativos a sustentabilidade. A tese defendida é a de que o crescimento econômico brasileiro entre 1980 e 2000 consegui gerar mais desenvolvimento que o crescimento econômico muito mais acelerado que o de outros países, como o Chile, a China e até mesmo a Coréia do Sul.

            O capítulo 2 do livro começa por uma análise das questões ambientais e suas teorias, e na minha opinião é a parte do livro em que o autor demostra relativo desconhecimento sobre o assunto, além de algumas opiniões controversas. No entanto, deixa ao longo do texto algumas pistas de que talvez não esteja tão certo do problema ambiental, e de que as posturas adotadas por alguns países podem não corresponder a um desejo de se ter um planeta melhor, mas de seguir outras orientações.

            Neste capítulo seguem algumas conclusões que me parecem contrariar o bom senso. O autor apresenta as conclusões do painel inter-governamental da ONU, e seus alertas catastrofistas, e apresenta também, ainda que em detalhe muito menor, uma tese contrária, que afirma que o aquecimento recente é produto natural e não antrópico. No entanto, mesmo diante da dúvida e do reconhecimento de que em matéria de ciência a maioria nem sempre (quase nunca) anda ao lado da verdade, o autor se posiciona a favor da adoção das previsões catastróficas da ONU. Neste ponto do livro, ele também relaciona que a adoção da Rússia ao protocolo de Kyoto talvez esteja mais relacionada a uma questão geopolítica (a manutenção de boas relações com a União Européia e o não alinhamento aos EUA) que a justificativas científicas para sua postura.

            No entanto o autor não desenvolve esta idéia e a deixa em aberto, partindo para um terceiro capítulo onde procurar condenar a filosofia analítica (toda a filosofia e ciência dignas deste nome) em função em detrimento de uma filosofia dialética, a qual ele critica, reconhecemos, mas no entanto tenta abraçar. É o tipo de crítica que se faz aos marxistas, procurando resguardar Marx dos ataques a seus seguidores e o colocando num patamar superior, com uma obra muito importante mas só compreensível para os iniciados. Ao mesmo tempo procura relacionar a tal dialética com as teorias da complexidade, dos sistemas, de fractais, etc.

            O livro, em minha opinião, vale mais pelas idéias apresentadas no capítulo 1, que podem inclusive servir como introdução a crítica da economia tradicional, sobretudo a macroeconomia e seus índices abstratos, como demandas e ofertas agregadas. Neste primeiro capítulo sente-se falta de alguma menção aos economistas institucionalistas como o Hernando de Soto por exemplo, que dizem que o problema dos países pobre está na impossibilidade de gerar capital a partir dos ativos (ver resenha sobre o livro O Mistério do Capital neste mesmo blog.) Mesmo assim este primeiro capítulo vale a pena ser lido e comentado.

            Os outros dois capítulos, sobretudo o terceiro, só mostram que as teorias da complexidade, que buscam gerar um cientista social capaz de ser cientista naturalista também, com todas as pretensões derivadas dos biólogos-economistas e economistas-biólogos, são impossíveis. O último capítulo mostra o quanto o marxismo esgotou suas possibilidades internas de renovação. Também serve de amostra a contaminação ideológica do pensamento de esquerda na universidade, porque incluir a discussão sobre dialética no meio do bate papo ambientalista, ou socioambientalista como quer o autor, é apenas uma mostra de que os temas tradicionais da esquerda já se esgotaram, e que suas tentativas desesperadas de condenar o capitalismo se revestiram de uma camada verde. (Como disse um colega, são os melancias, verdes por fora e vermelhos por dentro)

            A referência ao ISA (Instituto Socioambiental), ONG surgida do esfarelamento do CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação), instituição que congregou todos os religiosos ligados à "revolução", serve como mostra da transformação dos vermelhos em melancias. De todo modo, repito, é um livro que vale a pena ser lido, por ser leitura leve, sobretudo o primeiro capítulo. As teses do José Eli da Veiga são, ao meu ver, muito marcadas pela escolha de termos polêmicos e de visões aparentemente inovadoras (quando na verdade só são novas mesmo para o leitor desavisado e não para os conhecedores do assunto) que não colam mesmo dentro do ambiente universitário. Ele é o exemplo típico do contra-corrente-dentro-da-corrente que acredita andar na contra mão, quando no máximo está com a marcha ré engatada.

           



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