POR QUE O DISTRITÃO É PIOR QUE O VOTO DISTRITAL? A REFORMA POLÍTICA QUE NÃO DEVERIA OCORRER.
Fernando Raphael Ferro.
A Câmara dos Deputados, por iniciativa de
Eduardo Cunha, encaminhou uma proposta de reforma política que altera o atua
sistema de voto brasileiro. Dentro da proposta, há uma série de alterações que,
apesar do espírito inicial correto, incide numa série de equívocos. O maior
deles, em minha opinião, é a mudança do regime de voto proporcional para o
chamado “Distritão”.
Há tempos venho advogando em favor do voto
distrital no blog. A razão é simples: voto distrital implica concorrência entre
os candidatos. Os que disputam uma eleição estarão concorrendo a uma única vaga
no Congresso. Isso torna a referência mais clara para o cidadão sobre quem o
representa e a quem ele deve se dirigir na hora de cobrar mudanças e de
oferecer propostas.
O distritão, em princípio, incluiu o
princípio da concorrência majoritária na eleição para deputados e vereadores.
No entanto, os deputados não concorrerão por uma única vaga em seu distrito,
mas sim por todas as vagas do Estado, sendo que os melhores colocados serão
eleitos. O caso típico citado é o de São Paulo e seus 70 deputados: os 70 mais
votados serão eleitos.
O problema é esse sistema não torna as
campanhas mais baratas, pois o deputado com maior probabilidade de ser eleito
será aquele que for mais conhecido em todo o Estado. Para tanto, campanhas mais
caras serão necessárias. Além disso, deputados de grandes cidades e regiões
metropolitanas terão uma facilidade adicional para se elegerem, favorecendo
estas localidades em detrimentos das localidades menos povoadas.
Outro problema é que candidatos do mesmo
partido concorrem entre si pelas mesmas vagas. Isso os torna concorrentes e não
solidários. A conveniência de estar no partido A ou B passa a ser mais o tempo
de TV oferecido por este partido e a cota do fundo partidário disponível do que
as afinidades ideológicas. Candidatos do mesmo partido deveriam ser solidários,
não concorrentes. O voto distrital faz exatamente isso. O distritão agrava uma
situação já existente no voto proporcional, que torna as eleições um momento do
“cada um por si e Deus por todos”.
Outros equívocos existentes na proposta
encaminhada é o fim da reeleição e a sincronização entre a eleição de
deputados, senadores, presidentes, prefeitos e vereadores. Primeiramente a
questão da reeleição: ao contrário do que imaginam alguns, ela favorece os
candidatos com boa conduta, bom histórico, experiência e trabalho exemplar.
Isso numa condição de voto distrital para parlamentares.
Cito sempre o mesmo exemplo aqui de Curitiba.
Jaime Lerner foi um prefeito exemplar, extremamente popular. Além de ser
prefeito três vezes, fez seu sucessor e se elegeu governador. No entanto, a lei
barrava sua reeleição na época. Quem saiu prejudicado foi o eleitor curitibano.
Porque seus sucessores nunca estiveram a sua altura. Além disso, enquanto
governador, ele foi apenas mediano. Seu dom era governar a cidade. Houvesse a reeleição
na época, ele poderia ter feito mais mandatos, deixando um legado ainda maior
em Curitiba. No entanto, foi barrado pela regra da época. A renovação trouxe figuras que pouco
acrescentaram como foi o caso de Cassio Taniguchi e mesmo Rafael Grecca. Isso
mostra que a reeleição não é um mal em si.
Outra questão é a sincronização. Num sistema
presidencialista, como é o nosso, a população só pode dar seu aval ou
reprovação ao poder executivo a cada eleição. Se os parlamentares e o
presidente/governador são eleitos ao mesmo tempo, numa eleição a cada quatro
anos, como é a nossa, isso significa que a cada quatro anos tempos que escolher
entre trocar tudo ou nada. Porque manter o parlamento e trocar o executivo
significa, na prática, inviabilizar o executivo. O contrário também.
No caso, a melhor alternativa seria trocar
alternadamente executivo e legislativo. Assim, a cada dois anos vai-se às urnas
para referendar a gestão: vota-se no executivo e depois no parlamento que irá
suportá-lo ou impedi-lo de prosseguir. Esse é o método adotado no
presidencialismo estadunidense. No parlamentarismo não há esta necessidade
porque as eleições parlamentares podem ser convocadas a qualquer momento, desde
que ocorra a dissolução do parlamento por um voto de desconfiança do executivo.
Com isso, é possível concluir que a reforma
política encaminhada por Cunha dá mostrar clara de ter sido apresentada de modo
impensado, feita às pressas ou pior, com o objetivo único e exclusivo de piorar
algo que já é muito ruim no país. Porque o distritão, além de não resolver os
vícios do sistema atual, ainda irá limitar a eleição aos candidatos de campanhas
mais abrangentes territorialmente, diminuindo ainda mais a representatividade de
cada deputado frente a população diretamente por ele representada. A questão é
se este sistema foi escolhido de fato de modo impensado, ou se foi pensado para
beneficiar campanhas mais caras e para continuar favorecendo o jogo de trocas
entre executivo e legislativo que impera desde 1988 na democracia brasileira.
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