OLHANDO O PASSADO

        Por Fernando R. Ferro
          A duas fotos abaixo são da Biblioteca Nacional da Irlanda e encontram-se no arquivo dela no Flickr. mostram as ruas de alguma cidade da Irlanda do Norte, provavelmente Belfast, entre o final do século XIX e início do século XX. É de se notar que os bondes já são movidos a eletricidade e dividem o espaço com carroças puxadas a cavalos. Na primeira imagem há um senhor de chapéu atravessando a rua que parece prestes a ser atropelado. 


             Na segunda foto, de 1930, mostra o Albert Memorial em Belfast, tomada de um ponto de vista muito mais elevado, onde é possível notar a presença de vários automóveis. Vários deles utilitários transportando objetos. Poucos particulares. Ainda há um tráfego bastante significativo de carroças. Nada semelhante, porém, ao que vemos hoje em nossas cidades. Há também um senhor se deslocando numa moto, logo ao lado de uma bicicleta, logo no primeiro plano da imagem, atrás do que parece ser um pequeno caminhão carregando galões que devem ser de leite ou algo parecido. Os vários trilhos dos bondes fazem um desenho curioso no chão da rua, bastante larga da cidade. Os prédios, apesar de não serem muito elevados, mantem uma altura que deve estar próxima de 15 metros de altura. 

      Achei interessante compartilhar as duas fotos por dois motivos: um deles é que a quase ausência de verde na cidade. No primeiro plano da segunda foto, próximo ao poste, nota-se uma árvore, mas ela parece bastante solitária. Na primeira foto, então, eu não consegui identificar nada que remetesse à "natureza" não antrópica dos edifícios, ruas, máquinas e animais domésticos. Uma das razões, possivelmente, é que Belfast foi meio tardia no paisagismo mesmo, já que outras cidades incorporaram jardinetes à paisagem antes desta época. Outra é que, não sendo uma cidade grande, a natureza estava logo ali, há algumas quadras de distância. Hermos Moreira de Souza, acerca das plantar ornamentais, diz que elas "Preenchem espaços livres e adaptam-se a recipientes de enfeite, estabelecendo no mundo moderno o contato mínimo possível do homem com a natureza em locais onde esta é distante" (apud Lorenzi, 2013), o que seria a função do jardim, ou seja, permitir o contato com a natureza. 
       Mas no mundo moderno das cidades em expansão, com a natureza ainda tão próxima, com rios ainda não tão poluídos, com as casa tão próximas do refúgio do ar fresco, do silêncio e paz proporcionada pelo campo, dificilmente ver-se-ia necessidade de trazer partes desta natureza para dentro da selva de pedras. Hoje, aprisionados nela, vemos a necessidade de modificá-la, e torná-la menos árida.
Apesar da simplicidade da Balsa, a foto é da década de 1960
       Esta busca da proximidade com o natural, com o elo perdido da natureza, que nos faz ao mesmo tempo sentir amor e repulsa pela natureza e pelo ambiente construído, que nos atrai e nos cansa com a mesma facilidade, é nos faz mesclar o natural e o antrópico. As meninas brincando no jardim, imortalizadas numa foto de mais de cerca de 130 anos atrás, mostram que não é de hoje se busca uma natureza segura para nossas crianças, para fiquem distantes do mal da natureza pura, selvagem, mas ao mesmo tempo não fiquem aprisionadas nas máquinas, paredes, pedras, cercas e grades que ajuntamos para nós mesmos.
Já esta foto é de 1885, e as meninas brincavam ao abrigo de um jardim interno. Provavelmente, a natureza esta distante para elas.
     As cidades que criamos, uma vez que estabelecidas, assentadas, transformadas nos monstros gigantes de concreto e asfalto que vemos, ao poucos, com a ajuda de todos, vão sendo cultivadas e transformadas, tornando-se um ambiente mais agradável, palatável, digerível para todos nós. Isso não é tarefa apenas do poder público. Ao contrário. Talvez seja menos tarefa do poder público do que parte da iniciativa de cada um dos cidadãos residentes nas cidades. Os grandes parques, os jardins públicos e as praças são só uma pequena parte dos elementos que vitalizam as cidades e as tornam melhores. A maior parte é feita por cada um, no interior de suas casas, sobrados, condomínios e apartamentos. Até mesmo os muros devem ser transformados para tornarem-se melhores e mais agradáveis.
           Em 2015 vou me dedicar a disseminação de algumas ideias. Uma delas é o cultivo de cidades melhores, que começa de dentro para fora das casas. Vi que não adianta um transporte coletivo melhor se as pessoas continuarem tão péssimas quanto são. Tampouco leis melhores para péssimos cidadãos. O necessários são melhores cidadãos. Para mudar a todos, mudamos antes a nós mesmos. Assim, vou compartilhas as ideias que acredito estar tornando minha vizinhança esteticamente mais agradável e consequentemente, melhor. Não são ideias postas em prática por mim apenas, mas por todos os meus vizinhos. E não são ideias pensadas coletivamente. Mas individualmente. São fruto da vontade de fazer o melhor para si. Cada um cultivando no seu canto aquilo que imagina ser o melhor para o todo.  Espero ao final que este projeto resulte num plano editorial para um novo livro. Com sorte, resultará. Neste espírito, desejo a todos um Feliz Ano Novo.

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