DIFERENTES MEIOS PARA O MESMO FIM

Por Fernando R. F. de Lima.
            Para realizar uma viagem, temos muitos meios. Desde o mais simples e utilizado de todos, caminhar, até veículos espaciais, as chamadas astronaves ou espaçonaves. Dentro de uma cidade, contudo, as opções são mais limitadas. Um adulto comum, com uma carta de habilitação A/B, tem de quatro a cinco opções principais para realizar um trajeto simples, como ir de casa para o trabalho. Cada um apresenta vantagens e desvantagens.
            O automóvel é o meio predileto da grande maioria das pessoas, apesar de ainda não ser o mais utilizado. Mas em geral, o automóvel ainda é um dos grandes sonhos de consumo da maioria da população, junto com a casa própria e a estabilidade financeira. De certa forma, o automóvel e o se tamanho dizem muito sobre as realizações da pessoa e fala também um pouco sobre sua personalidade (ou sobre aquilo que ela gostaria que as pessoas pensassem de sua personalidade). O carro é o grande símbolo pop da nossa sociedade, e é praticamente impossível imaginar uma família bem sucedida que não tenha pelo menos um automóvel na garagem.
            Contudo o automóvel não é exatamente o meio mais eficiente para se locomover dentro de uma grande cidade. Ele ocupa muito espaço (cerca de 4 m²), para levar na maioria das vezes apenas um passageiro. Além disso, consumo muito combustível e depende um sistema viário bem estruturado para funcionar com desenvoltura. O melhor uso para o automóvel, na minha opinião, é em viagens de mais de 50 até 250 km de distância.
Isso porque o motor de um automóvel, em geral, só atinge a temperatura ideal de funcionamento depois de 4 km de funcionamento, e seu consumo ideal situa-se numa faixa de velocidade que se estende entre 60 e 120 km/h. Além disso, a possibilidade de realizar trajetos porta a porta, faz com que seja possível realizar este tipo de viagem, caso as condições viárias permitam, muito mais rapidamente que optando por um trem, um avião ou um ônibus de viagem, com mais conforto e segurança que numa motocicleta.
Outra possibilidade são os meios coletivos de transporte. Na grande maioria das cidades, o ônibus é a principal opção, mas em algumas há também a disponibilidade de trens e de Sistemas de Transporte Rápido por Ônibus. No primeiro caso, o ônibus tem uma série de desvantagens em relação aos automóveis: são normalmente cheios, seu horário de deslocamento é rígido (o usuário deve se adapta aos horários do ônibus), possuem pouca mobilidade (trajetos fixos e pouca capacidade para desviar de acidentes ou trocar de pista), o que torna as viagens mais demoradas.
Mas nem tudo é ruim: o ônibus costuma ser mais barato que o automóvel (a maioria dos motoristas esquece o custo de estacionamento em suas contas, a depreciação e a manutenção do veículo), além de não demandar grandes investimentos monetários da parte do usuário para poder utilizá-lo (ninguém compra o próprio ônibus, apenas paga a passagem). Seu trajeto ideal é em viagens de até 15 km, em que não seja necessária a baldeação (que reduz drasticamente a velocidade média de percurso).
Os sistemas de trem, sejam metrôs ou trens metropolitanos e os BRT (o sistema de ônibus por via exclusiva), tem com vantagem principal a velocidade de deslocamento, uma vez que não costumam estar sujeitos a congestionamentos. O preço é baixo para o usuário, mas por outro lado as opções de trajetos são reduzidas, e normalmente sua utilização depende de baldeação através de outros sistemas. Sistemas metropolitanos de trem são eficientes desde distâncias pequenas até em grandes distâncias (comuns nos subúrbios), podendo deslocar milhares de pessoas por hora em cada sentido.
Os sistemas de longa distância (maiores que 200 km), podem atingir velocidades comerciais de até 500 km/h, que os tornariam mais eficientes que aviões em percursos de 600 a 800 km/h de distância, uma vez que os trens não dependem de procedimentos de cheking, despacho de bagagens e podem atingir pontos bem centrais numa grande cidade se combinados com sistemas subterrâneos. É um meio confortável, eficiente, mas caro e com baixa disponibilidade, nula no caso brasileiro.
Por fim, vou falar dos três meios mais baratos, indo do mais caro para o mais barato, que por sua vez guardam uma relação direta com seu alcance. O primeiro deles é a motocicleta. É o meio de transporte cuja utilização mais cresce nas grandes cidades por causa de seu custo reduzido (uma moto 125 pode sair por menos de R$ 6 mil, 0km), economia de combustível, e grande mobilidade. O motor das motos também precisam de 3 a 4 km para atingirem temperaturas ideais de funcionamento, mas sua maior vantagem é que ocupam pouco espaço, cerca de 1m², mas distribuídos longitudinalmente, o que as tornam muito maneáveis.
Há diversos tipos de motos, desde as motos mesmo até os scooters, que se adaptam aos mais variados perfis. Para utilização diária em curtos trajetos os mais indicados são os scooters, por seu bagageiro sob o banco, proteção contra o vento, sujeira e sua facilidade de pilotagem. O ideal é utilizá-las em trajetos até 50 km. Seu maior problema é a vulnerabilidade do piloto, principalmente em velocidades superiores a 40 km/h, onde qualquer acidente pode ter conseqüências graves.
Na sequência, temos as bicicletas. Por sua propulsão humana, as vezes auxiliada por eletricidade, as bicicletas são indicadas para trajetos de até 10 km, que em condições ideais podem ser cumpridos em menos de 30 minutos. O custo de aquisição varia muito, desde uns R$ 200,00, para uma bicicleta montada, sem marchas, cujo custo de manutenção é baixíssimo, até os R$ 3000,00 cobrados por modelos elétricos. Há ainda as bicicletas voltadas para competições que podem custar o preço de um carro médio, mas não são adequadas para o transporte urbano.
No fim da cadeia, os deslocamentos a pé, que são os mais comuns e mais baratos. Em geral, tudo que é necessário e um bom calçado para proteger os pés da sujeita e de objetos cortantes, e disposição para fazer um mínimo de exercício. Uma pessoa normal caminha a uma velocidade média de 5 km/h, o que permite cobrir até 2,5 km em 30 minutos. Além disso, a caminhada pode ser facilmente substituída por uma carona, um taxi, ou pelo transporte coletivo, ou ainda ser combinada com outros meios de transporte, além de fazer bem para a saúde.
Comparando uma bicicleta com uma moto, a moto ganha muito em confiabilidade. Em compensação perde na eficiência. Eu tenho uma Caloi sprinter, 16 marchas, que pesa 12 kg. Ela me carrega (100kg) e mais uns 10kg de bagagem tranquilamente. O problema de confiabilidade fica por conta dos pneus (que duram pouco e furam fácil), o restante é um relógio. Se minha moto fizesse a mesma coisa, com seus 150 kg ela poderia transportar 1,5 toneladas. E o meu carro, com 950 kg, poderia levar 9,5 toneladas. No entanto, a moto leva só dobro do seu peso em carga, e o carro só 50%. Neste quesito, a bicicleta é o melhor veículo.
Em matéria de velocidade, a bicicleta leva vantagem sobre o ônibus (tomando como referência Curitiba), e fica muito perto do automóvel em tempo de deslocamento. Da minha casa ao colégio em que eu trabalho no centro, eu levo aproximadamente 1:10 usando o ônibus (contando o trajeto porta a porta, isto é, da porta da minha casa à porta do colégio). De bicicleta eu cumpro o trajeto em 40 minutos. De carro são 35 minutos e de moto 25 minutos. Da minha casa até o colégio são 12 km o que, no meu ritmo de caminhada significaria aproximadamente de 1:10h a 1:20h. De moto e de carro eu gasto de 5 a 7 minutos caminhando do estacionamento até o colégio. De bicicleta eu paro dentro do colégio, e de ônibus eu tenho que andar 1 minuto no máximo.
O que me faz perder tempo de carro e de moto é o tempo necessário para manobrar o carro e o tempo necessário para me equipar na moto. Leva-se aproximadamente uns 5 minutos, contando as duas etapas. Eu não gosto de ficar defendendo um meio de transporte em detrimento dos outros, porque imagino que a forma como as pessoas se transportam deve servir aos seus objetivos, e ninguém para saber melhor quais seus próprios objetivos que cada indivíduo sozinho no silêncio do seu lar. Contudo, nossas cidades, possuem uma clara orientação pró-automóvel.
Em Curitiba, quase todas as ruas são asfaltadas, mas poucas têm a sinalização básica de segurança para pedestres. As ciclovias são nada mais que desenhos no mapa, voltadas para recreação, interligando parques, e compartilhada, na maioria das vezes com pedestres. Nas ruas inexistem sinalizações do tipo "ciclofaixa". Além disso, não há "estacionamentos" públicos de bicicletas e a maioria dos estacionamentos privados não aceita esse tipo de veículo, por não considerá-lo um veículo.
As motos são igualmente descriminadas. Há inúmeros obstáculos extremamente perigosos em caso de quedas, como muretas dividindo pistas e boa parte das pistas são pintadas (quando pintadas) com tintas que se tornam extremamente escorregadias em dias de chuva. Nos cruzamentos poderia haver faixas de retenção separadas para motocicletas e automóveis, e vagas para motos são raras fora da área central. Os buracos nas ruas, que em geral não causa maiores prejuízos num carro, podem causar acidentes graves em motociclistas e ciclistas.
            Ainda sobre Curitiba, temos um sistema de ônibus razoável, que é desconfortável e lento nas linhas que atendem os bairros e desconfortável, porém rápido, nas linhas exclusivas. Mas o sistema de ônibus, sobretudo para quem o utiliza em curtas distâncias, ainda é caro. Para melhorar a mobilidade nos grandes centros urbanos, não basta ampliar o sistema viário, ou ampliar o sistema de transporte coletivo, ou fazer qualquer outra coisa que gaste bastante dinheiro e tenha bastante impacto publicitário. É necessário, antes de tudo, pensar que a mobilidade se realiza de múltiplas formas, algumas mais eficientes, outras menos, e algumas atingem a eficiência máxima quando combinadas entre si.
Não imagino uma criança de 10 anos indo para escola no transporte coletivo, tampouco utilizando sua bicicleta: atualmente isto é perigoso, caro e preocupante. Também não imagino executivos de terno e gravata dispensando seu automóvel para se aventurar numa bicicleta, saindo de sua casa ou sobrado no subúrbio e vindo para o centro. Mas acho que muita coisa pode mudar. Estudantes universitários, sobretudo os que estudam nos períodos diuturnos, são potenciais usuários de bicicletas, assim como estudantes de ensino médio. Operários e empregadas domésticas têm grande potencial para utilizar ônibus, combinados ou não com bicicletas e caminhadas.
Não sou contra cada família ter seu automóvel, de preferência um bem confortável com vários itens de conveniência, e até mesmo mais de um por família. Mas eu sei, e acho que todo mundo tem alguma suspeita sobre isto, que é inviável que todas as pessoas utilizem o automóvel como única forma de deslocamento, para todos os trajetos, o tempo todo. A infra-estrutura necessária para dar conta de oferecer condições para que os automóveis sejam utilizados por todos com todo seu potencia é tão cara que nem mesmos os EUA conseguiram ser ver livre dos congestionamentos, apesar de um grau de investimento nesta área sequer imaginável para o Brasil.
Creio também, que seria do interesse de todos, motoristas ou não, que os automóveis fossem deixados mais vezes em casa do que nos dias atuais. Para tanto, opções são necessárias, e para viabilizar algumas não é necessário muito dinheiro, nem esquemas muito complexos. O que mais falta é disposição e capacidade de enfrentar os problemas, e coragem para implantar soluções que fujam do comum.
Fernando R. F. de Lima
www.democraciaeliberdade.com.br
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P
or um mundo mais livre e melhor!

Comentários

Muito bom. Melhor se lembrarmos a mídia em torno da sustentabilidade. Se os verdes realmente querem um mundo menos poluído, é só começar a mudar hábitos significativos, entre eles deixar o carro na garagem e usar o transporte coletivo, evitando ao máximo modais perdulários e poluentes. Se a maioria da população optar pelo coletivo, ele será melhor.

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