DISFUNCIONALIDADE REPRESENTATIVA




Por Fernando Raphael Ferro

A democracia brasileira está em frangalhos. O maior líder político que o país já teve está na cadeia. Não que eu tenha, ou já tenha tido alguma simpatia por ele. Mas o fato e triste. Lula foi o maior líder político do país. Nenhuma figura política é capaz de gerar tantas opiniões contrárias ou favoráveis como ele. Desde a primeira eleição livre no país, pós ditadura militar, ele esteve em todos os pleitos como candidato ou cabo eleitoral.
Seu nome mobiliza massas. E, no entanto, ele jaz atrás das grades. Alguns defendem que sua prisão possa não ter seguido todos os trâmites legais, e que talvez o juiz Sérgio Moro tenha se afobado ao pedir a prisão antes que o réu tenha podido recorrer a todos os embargos. O fato é que desde de sábado 7 de abril o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está aprisionado na sede da Polícia Federal em Curitiba.
Os demais líderes políticos que foram presos perderam a importâncias. O Ex-Governador Sérgio Cabral, Paulo Maluf, o Deputado Eduardo Cunha, e até mesmo empresários como Marcelo Odebrecht, derreteram em termos de importância diante da prisão de Lula. Mas pior que isso é a gigantesca crise de representação política que vive o país.
Temos um cenário de grande dificuldade se delineando para todos os candidatos. Nenhum nome aparece como favorito, ou com baixa rejeição para as próximas eleições, em quaisquer que sejam os níveis. Nem deputados estaduais, federais, senadores, governadores ou candidatos a presidente terão uma disputa eleitoral fácil. Não que as anteriores tenham sido, mas esta será particularmente difícil.
Nomes que aparecem na dianteira, como Jair Bolsonaro e Marina Silva, apesar da aparente popularidade entre partes do eleitorado, sofrem igualmente doses gigantescas de rejeição. E nomes que outrora mobilizaram multidões e foram ao segundo turno, como é o caso de Geraldo Alckmin, que chegou a rivalizar com Lula na disputa de 2006, agora aparece extremamente queimado e poucas perspectivas reais no atual cenário.
O PT, que ainda é o partido com maior número de simpatizantes no país, não possui um nome forte para indicar. Nota-se, afinal, que o PT era o partido de um nome só, e com seu cabo eleitoral atrás das grades, será difícil para qualquer nome se viabilizar eleitoralmente. Em todos os lugares o que se nota são esperanças de candidatos com muita vontade e pouca história, experiência e cheios de dúvidas.
2018 delineia-se no panorama das eleições como um novo 1989. E assim como as eleições de 1989, pode ser que uma crise ainda maior venha depois das eleições, dependendo de quem for eleito. E tudo isso deriva da nossa grande crise de representação.
No plano legislativo, a tragédia se repete. Como a reforma política não avançou, o nosso sistema disfuncional de eleição proporcional permanece. E assim, as centenas de milhares de candidatos às vagas aos legislativos, com seus parcos recursos continuaram a subsidiar a entrada das velhas raposas políticas que investem grandes somas em suas campanhas. Ou seja, os nomes tradicionais da política certamente se manterão, com muitos júniors, filhos e netos mantendo as tradições familiares de patrimonialismo, coronelismo, nepotismo e sem qualquer perspectiva de uma reforma política que implemente o voto distrital.
Sobre o judiciário e o quarto poder, os Ministérios Públicos, nem comento muita coisa. Esses poderes não democráticos e não controlados pelo voto, mantém-se sua aura de neutralidade enquanto mantem seus próprios privilégios e utilizam de barganhas imorais com o legislativo e executivo para aumentar os próprios privilégios.
Enquanto toda essa disfuncionalidade representativa não for combatida, nada irá mudar neste país. Mas para muda-la, precisamos mais do que candidatos e eleições. Precisamos de uma reforma intestina na administração pública, que altere a própria dinâmica do estado. A própria relação dos poderes. Que altere a própria forma atual de como se faz política e de como se gera lideranças. E obviamente, as lideranças que conduziram esse processo não podem sair do próprio movimento que as gerou. O que torna a mudança conceitualmente impossível.
O Brasil não muda pelas próprias mãos. Não há mudança possível no atual cenário democrática. E sem democracia, não há possibilidade de mudança. Assim, resta apenas a conformidades ou então a fuga. A conclusão é pessimista, mas recordo uma vez mais Virgílio que leu a frase na entrada do primeiro círculo do inferno: “Lasciate ogni speranza voi ch’entratte.”

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