ALTA NO PREÇOS DOS ALIMENTOS PODE LIVRAR-NOS DAS POLÍTICAS AGRÍCOLAS

Por Fernando R.

 

Durante toda a segunda metade do século XX o preço dos alimentos caiu em termos reais frente aos outros produtos, sobretudo os industrializados. A renda dos agricultores entrou num processo de queda acentuada, por conta do barateamento dos preços do milho, trigo, arroz e soja. Em grande parte dos países europeus e nos EUA foram adotadas políticas para a proteção dos agricultores e manutenção dos preços dos produtos agrícolas de modo a evitar a evasão completa das áreas rurais nos países menos competitivos.

Países como o Brasil, neste meio tempo, viram o campo se esvaziar num processo de migração em massa para a grandes cidades. Se nos anos cinqüenta do século XX a maior parte da população brasileira vivia na zona rural, nos anos 2000 mais de 80% encontrava-se nas cidades. Este processo levou a favelização dos grandes centros urbanos, e a criação de uma grande massa de pessoas subempregadas, pessoas que acabaram contribuindo para o processo de industrialização do país através da oferta de mão-de-obra para a nascente indústria nacional.

No campo, o processo foi de intensa concentração de terra, formando grandes fazendas capitalistas que se utilizaram de capital intensivo para poder fazer frente aos preços em queda dos alimentos. O Brasil foi um dos países que mais investiu em conversão de terras e mecanização agrícola no século XX. Criou uma industria nacional de equipamentos e implementos agrícolas, empresas de pesquisa genética e seleção de variáveis e apostou, com capital privado, na colonização do interior sob uma base agropecuária, na contra-mão dos preços históricos dos alimentos. Como resultado, o país é hoje um dos mais competitivos na produção de alimentos, dependendo muito pouco de políticas agrícolas e subsídios.

A recente escalada dos preços do petróleo e das comodites agrícolas tem uma origem comum: a criação de uma classe média nos chamados países emergentes, com destaque especial para a China e a Índia, que pressionou a demanda de petróleo e alimento. Com isso, os preços têm subido de forma constante nos últimos anos. Outro possível fator é a entrada de especuladores nos mercados de futuro de commodites, que teria forçado os preços para cima, sobretudo no petróleo, gás, milho, arroz e soja.

O resultado destes dois movimentos, é que está se invertendo uma tendência que cinqüenta anos de políticas agrícolas não conseguiram. E agora, muitos têm anunciado que isto é um grande problema a ser solucionado. Na verdade, esta tendência é a solução para todas as políticas agrícolas, que perdem a razão de existir.

Numa sociedade aberta o controle de preços só é possível quando há abundância do bem cujo preço será controlado. Quando a oferta é muito grande, é relativamente fácil manter uma política de preços mínimos, evitando, deste modo, que os produtores menos eficientes saiam do mercado. O controle de preços só é compatível com a manutenção da ordem social e política quando ele deixa os preços artificialmente caros.

Os consumidores não se sentem explorados, porque nominalmente, e até mesmo em termos reais eles não percebem alteração nos preços. Afinal, psicologicamente falando, ninguém espera uma deflação de preços. Os produtores sentem-se satisfeitos, pois preços em queda forçariam diversos deles a saírem daquele mercado, buscando algum ramo em que pudessem competir de forma sustentável.

O controle de preços num processo inflacionário leva a escassez de bens, e a gritaria tanto por parte dos consumidores, que simplesmente não encontram os produtos que desejariam encontrar, quanto por parte dos produtores, que são prejudicados por terem de vender algo abaixo do melhor preço que poderiam obter. Os controles de preço em processos deflacionários são aceitos pela população devido a sensação de enriquecimento; nos processos inflacionários eles causam comoção pública, filas e protestos.

Os subsídios agrícolas e as barreiras às importações foram as formas escolhidas para manter durante anos os preços dos alimentos acima dos níveis de mercado. Para tanto, foram criadas diversas políticas de preços mínimos, e dados  subsídios às exportações. Estes mecanismo tiveram como conseqüência marginal a destruição da agricultura tradicional da África, convertendo áreas antes agropastoris em savana e floresta, intensificando a  migração campo-cidade nestes países.

Recentemente diversos órgãos ambientalistas e "especialistas de plantão" escolheram os biocombustíveis como vilões do processo de encarecimento do milho, da soja e da carne. A questão, entretanto, deveria ser vista de outra forma: o aumento nos preços é a primeira oportunidade em mais de 50 anos de se colocar um pouco de racionalidade no mercado mundial de alimentos, com uma produção sendo puxada pela demanda e os preços regulados pelo mercado, e não por burocratas.

Em menos de cinco anos a alta nos preços dos alimentos terá elevado suficientemente a renda para compensar a aparente inflação de agora e o desenvolvimento da agricultura em terras atualmente marginais, terá feito crescer a renda global, de modo que o preço dos alimentos não mais será pauta de tão acaloradas discussões. Até lá, os tocadores das trombetas do apocalipse já terão escolhido outro alvo, outra ameaça, e outras inúmeras desculpas para defender o estatismo e o controle dos preços em outras áreas.

Se alguém tem alguma coisa a perder com a alta dos preços dos alimentos, estes são os burocratas que atualmente controlam as políticas de subsídios juntamente com os políticos que até então têm ganhado eleições tendo este tema como bandeira. Esta subida nos preços pode levar a sustentabilidade almejada a tantos anos por todos, e à expansão do capitalismo na agricultura mundial.

 

 



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Comentários

bertrand disse…
Fernando, parabéns, excelente análise, de um ponto de vista liberal. Eu não tenho esperança de ver os burocratas fora do campo em breve. Especializaram-se em não fazer nada de útil exceto atrapalhar os que trabalham. São os concursados aliados aos eleitos, a classe parasita, que tanto dano traz. Fica a esperança de os preços trazerem um mercado menos preso. Até lá, mande bala, que tuas análises são ótimas.
INTERCEPTOR disse…
Parabéns, Fernando. Boa análise.

Só tenho dúvidas quanto aos 80% de população urbana no Brasil. Isto é o que o IBGE diz, que considera como "cidade" o que em outros países seria uma espécie de "núcleo rural".

Conferir a respeito Cidades Imaginárias de José Eli da Veiga que analisa o fenômeno, possivelmente, criado em nosso país para demandar recursos federais, i.e., nossos para criação de burocracias municipais.

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