O problema maior do ensino superior no Brasil

Ao contrário de outros países em desenvolvimento, o Brasil não tem conseguido adequar satisfatoriamente seu ensino superior às necessidades do mercado de trabalho. Obviamente que isso pode ser reportado ao fato de que nem mesmo conseguimos adequar satisfatoriamente o ensino fundamental às necessidades da cidadania. Tampouco fornecer um ensino médio de qualidade. Quando se analisam os testes internacionais que avaliam a qualidade da educação, o país em geral fica numa péssima situação.
Em artigo anterior comentamos a questão levantada pela matéria da revista Exame de setembro de 2006. Na coluna da Veja da semana passada, Cláudio Moura e Castro trata novamente do mesmo problema. Dizem muitos que o problema maior do ensino só poderá ser resolvido se investirmos nas bases. Outros afirmam que o ensino superior não pode ser deixado de lado. Ambos os lados da discussão estão de certa forma certos. No entanto, em minha opinião, o problema maior está no modelo de negócio do ensino superior no Brasil.
A superioridade do “mercado”, isto é, da iniciativa privada, em resolver problemas depende, em grande parte, da legislação que regula aqueles problemas. E a educação é um tipo de negócio em que as leis, no Brasil, tendem a privilegiar os piores jogadores, aqueles que trabalham pela degradação e não pela melhoria. Acaba por ser que o ensino privado só consegue atuar de modo satisfatório na educação de elite, e ainda assim, com resultados a serem provados.
A meu ver, isso ocorre por várias razões. A primeira delas é a questão de que a expansão do ensino superior no Brasil, que ocorreu juntamente com a estabilização da economia, não foi acompanhada por um crescimento da poupança das famílias para pagar por esse ensino. Foram criadas instituições de ensino que não tinham alunos em condições de pagar pelas mensalidades. Deste modo, a expansão da oferta de vagas acabou por ser maior que o poder de consumo da população que ansiava por elas.
Com isso, as melhores faculdades privadas perderam alguns dos seus alunos para outras faculdades com preços menores, e estas, por sua vez, passaram a competir pelo preço, deixando a qualidade num segundo plano. O problema é que quando uma faculdade privada investe em qualidade (melhores professores, laboratórios, salas de aula, recursos tecnológicos), ela necessariamente faz um investimento de longo prazo, que sendo custeado apenas pelas mensalidades, exige um número mínimo de alunos e uma taxa de adimplência elevada, o que frequentemente não ocorre. Para muitas, as mensalidades passam a ser insuficientes até mesmo para pagar os salários, o que mina de vez a confiança dos professores na instituição, e por tabela, a possibilidade de se fazer uma educação de qualidade.
Do lado dos alunos, estes encontram uma facilidade bastante grande para trocar de instituição, mas encontram-se vulneráveis quanto à garantia de que terão professores qualificados, e de que estudarão numa instituição que preza pela qualidade do ensino. Isso porque os critérios de avaliação são ainda muito deficientes, e as melhores instituições, são pelos motivos acima descritos, inacessíveis à parcela mais pobre da população.
Com isso, a razão pela qual o ensino superior privado fica muito atrás do ensino superior público, no Brasil, é a insegurança em que vivem os alunos e as instituições. Este problema não existe nas universidades públicas, em que o aluno não paga pelo curso e os professores, apesar dos salários nem sempre satisfatórios ou compatíveis com a qualificação exigida, são regularmente pagos.
O Pro-Uni, do governo federal, vem de certo modo garantir alguma segurança jurídica às instituições, e um importante auxílio financeiro aos alunos mais pobres. No entanto, na falta de critérios de avaliação mais rigorosos, de sua fiscalização e aplicação, o que acaba ocorrendo é uma transferência de recursos públicos para instituições que oferecem aos alunos um ensino superior de qualidade muito baixa, e que vivem sem recursos para investir em tecnologia de ponta.
Com essa situação em vigência, o ensino superior não cumpre com seu papel de divulgador de tecnologia de ponta, pesquisa científica, e qualificação de mão-de-obra de elite para as indústrias modernas. Ou melhor, poucas instituições encontram condições objetivas de cumprir com este objetivo. Hoje, o estado da união que conta com os melhores recursos para essa ação é certamente, o estado de São Paulo, com sua USP, UNESP’s e UNICAMP. Cabe ressaltar, porém, que dada a míngua de recursos públicos, este é um modelo difícil de reproduzir em outras unidades da federação. Cabe repensar o modelo de negócios, para que o ensino superior possa, então, cumprir com seu papel.

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