DESINDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL?
Por Fernando R. F. de Lima.
O fato é que a indústria (que inclui a indústria
de transformação, produção e distribuição de água, eletricidade, gás e serviços
de limpeza urbana, e a indústria extrativa mineral) atingiu a menor
participação no PIB (14,6%) em 2011 desde os anos 1950. Isto significa que a
indústria contribuiu menos para a geração de riqueza neste último ano do que em
todos os períodos anteriores desde os ambiciosos planos de industrialização
implantados no país a partir da segunda guerra mundial.
Obviamente, os donos de grandes indústrias no
país clamam contra a desindustrialização em curso, sendo que os economistas,
sobretudo os desenvolvimentistas, afirmam que o país corre grandes riscos
enquanto a indústria naufraga. Alguns, como Bresser Pereira, falam em doença
holandesa, ou seja, o estrangulamento da indústria por causa do câmbio
sobrevalorizado.
Mas, por outro lado, estamos vivendo um dos
maiores períodos de investimentos em novas plantas industriais no país, com a
instalação de novos fabricantes/montadores de automóveis, franca expansão da
indústria naval, petroquímica, alcoolquímica, agroindústria, mineração,
siderurgia, aeronáutica e segmentos correlatos. Assim sendo, como pode os
investimentos industriais estarem crescendo, as fábricas sendo ampliadas, o
emprego industrial em relativa alta e ainda assim estarmos vivendo um processo
de desindustrialização?
O primeiro problema que eu vejo nesta
argumentação é a utilização do PIB como critério de referência. Quando se fala
em PIB da indústria, na verdade estamos falando em Valor Adicionado (VA) da
indústria. Este conceito ilustra a riqueza criada no processo industrial. O VA
é a diferença entre o valor de compra de todos os bens e serviços necessários
para a produção e o valor de venda da produção. Isto é, o VA é a riqueza gerada
no processo.
Antigamente, nos anos 1950, as fábricas
compravam os insumos básicos, processavam e entregavam ao mercado produtos
acabados. Este tipo de fabricação, integrada verticalmente, tinha como
característica uma grande geração de Valor Adicionado. Atualmente, os
fabricantes se especializam na produção de alguns poucos produtos, e muitas
vezes seu trabalho final é apenas “montar” o produto, embalá-lo e prepará-lo
para distribuição. Algumas vezes, até mesmo este serviço de embalagem e
preparação é terceirizado para uma empresa especializada neste segmento.
Outro fato é que, no passado, as grandes
fábricas além de cuidarem da manufatura de seus produtos, também gerenciavam o
funcionamento de suas estruturas. O próprio fabricante gerenciava os
refeitórios, a limpeza, a segurança, a manutenção do prédio, etc. Todos estes “serviços”
eram contabilizados como parte da indústria. Hoje estes serviços são todos
terceirizados e se encontram contabilizados no PIB no setor terciário. Deste
modo, os empregos em fábricas não diminuíram tanto quanto se diz, mas mudaram
de segmento pelo simples processo de terceirização. Com isso, a participação do
terciário também avançou.
Este processo, obviamente, levou a as
empresas a contabilizarem mais compras e a estreitarem suas margens, ou seja, a
reduzir o VA industrial. Contudo, isto não significa que as fábricas passaram a
gerar menos riqueza para seus acionistas, porque o que importa no processo todo
não é a contabilidade social, mas sim a contabilidade para os acionistas da
fábrica. Pouco importa a queda do VA se a empresa lucra mais e distribui
maiores dividendos aos acionistas. Na verdade, todos estes processos de
terceirização só ocorreram porque se mostraram menos custosos e mais eficientes
que a operação verticalizada.
Por meio desta análise já é possível compreender
boa parte da queda da importância relativa da indústria no PIB brasileiro. Em
partes a participação da indústria diminuiu porque a dos serviços cresceu. Mas
não é só isso. No PIB também são contabilizados os valores dos impostos, que
tem crescido acima do VA há vários anos. Entre os segmentos mais prejudicados
por este processo encontra-se, justamente a indústria. Isto porque a
agricultura, que também viu sua participação cair no PIB (apesar disso ninguém
fala em “desagriculturização” da economia), tem uma participação muito grande
nas exportações, que são menos taxadas que a indústria voltada para o mercado
interno.
Vistos deste ângulo, a questão toda da
desindustrialização parece uma grande falácia, ou seja, um discurso sem
fundamentação nos fatos. Mas de fato há outro fator que tem afetado as cadeias
industriais no país. Muitos industriais têm percebido que é mais barato comprar
seus insumos de fornecedores externos, ao invés de fornecedores brasileiros.
Com isso, o conteúdo legitimamente “nacional” de seus produtos diminui.
Obviamente, os que mais sofrem com este processo não são os grandes industriais
da FIESP, mas sim as pequenas e médias indústrias.
Para finalizar, o governo federal vem
sinalizando medidas para proteger a indústria nacional. Neste processo,
obviamente, as medidas incluirão redução temporária da carga tributária, como é o caso do
que é feito com o IPI para a linha branca, sobretaxação de produtos importados
(que só atenua o problema, porque as peças para montar os nacionais continuaram
sendo importadas) e crédito subsidiado para as empresas. Só que este terceiro
fator, obviamente, só irá servir de consolo para as grandes empresas, porque o
BNDES, já não é de hoje, adotou uma política de privilegiar os “campeões
nacionais”, ou seja, aqueles segmentos da indústria que tem potencial para
tornarem-se players globais. No andar
da carroça, a participação da indústria no PIB tem grandes possibilidades de
continuar a decrescer, sem que o país deixe de ter indústrias por causa disto.
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Parabéns mais uma vez.