BICICLETAS E GRANDES CIDADES
Por Fernando R. F. de Lima.
A
ainda recente morte da ciclista Juliana Dias tem gerado diversos editoriais nos
principais jornais do país (aqui
vai um exemplo, da Folha de S. Paulo de hoje (14/03/2012) e outro, anterior).
Todos tem discutido o direito dos ciclistas compartilharem as ruas com os
outros veículos, convivência que nem sempre é pacífica. Assim como no caso dos
motociclistas, o que mata os ciclistas é a diferença de massa e velocidade
entre os veículos envolvidos nos acidentes, com a diferença de que quem pilota
a moto controla sua velocidade, podendo calcular melhor seu grau de exposição
ao risco que um ciclista.
A
bicicleta é um veículo extremamente leve em comparação com o peso que ele
transporta. Pesando menos de 15 quilos, leva facilmente uma pessoa de 80 kg
(considerando roupas e bagagens). O aproveitamento energético também é
excelente, sendo que a maior parte da energia empregada pedalando vira
movimento. Além de leves, as bicicletas são baratas (a maioria delas, é claro),
de manutenção simples e ocupam pouco espaço para estacionar, manobrar ou mesmo
se locomover. Ainda podem atingir velocidades muito superiores a de um ser
humano caminhando ou ainda numa corrida leve, sem exigir para tanto grande
preparo físico. Isso todo mundo já sabia, e este é o grande argumento em favor
do “retorno” das bicicletas à paisagem urbana.
Coloquei
o retorno entre aspas porque, como já foi destacado em outro editorial
da folha, as bicicletas nunca saíram da cena urbana, principalmente nas
pequenas cidades, mas também nas grandes metrópoles. Aqui em Curitiba, por
exemplo, centenas, senão milhares, de trabalhadores se deslocam diariamente
usando a bicicleta, quase sempre compartilhando as vias exclusivas de ônibus
com os temíveis biarticulados. Mesmo sendo uma questão conhecida há muito
tempo, em 30 anos de vias exclusivas na cidade ninguém tomou a providência de
criar ciclovias, ciclofaixas ou ainda conscientizar os motoristas de ônibus da
letalidade de um encontro entre uma bicicleta e um veículo de mais de 15
toneladas.
A
questão, no final, se resume ao seguinte: o que é possível fazer para que
existam condições efetivas de utilização da bicicleta como meio de transporte
diário (e não apenas para lazer) em grandes cidades? A mais básica de todas as
providências é a criação de rotas para o uso de bicicletas. Para tanto, deve-se
verificar em quais vias há maior movimentação de ciclista e ver se é possível alocar
este fluxo em vias com menor movimento de veículos motorizados. Caso não seja,
o melhor a fazer é sinalizar a via horizontal e verticalmente para alertar os
motoristas sobre o fluxo constante de pedestres e reduzir os limites de
velocidade permitidos nestas vias. Sempre que possível indicar alternativas
para ciclistas e pedestres.
As
rotas de bicicletas são os melhores e mais baratos instrumentos para facilitar
o compartilhamento da via entre os diferentes veículos. Outra medida, mais cara
e nem sempre compatível com a via, é a criação de ciclofaixas, que nada mais
são que pinturas no asfalto para o tráfego exclusivo de bicicletas. As
ciclofaixas são problemáticas sobretudo pela necessidade de fiscalização para
saber se estão sendo ou não respeitadas por motoristas e motociclistas. Também não
eliminam o problema do estacionamento e dos cruzamentos que continuam sendo críticos.
Ciclofaixas devem ser acompanhadas também de abundante sinalização vertical e
horizontal.
Por
fim, as ciclovias, que seriam vias exclusivas para ciclistas. Nos bairros, as ciclovias
poderiam ser traçadas pelo meio dos quarteirões, como atalhos para ir de um
lugar ao outro. Nas avenidas expressas, como uma pista segregada da calçada
para não misturar pedestres e ciclistas. Quanto ao centro das cidades, é muito
difícil criar ciclovias, optando-se, sempre que possível, pelas ciclofaixas e
pelas rotas.
Estas
medidas são o que há de mais barato e efetivo em termos de tecnologia a ser
aplicada para a convivência entre bicicletas e veículos motorizados. Além
disso, muita verba deve ser gasta em campanhas e em fiscalização do cumprimento
das regras de trânsito. Nenhuma destas medidas é, em si mesma, cara. Verba para
elas existem, advindas das taxas de licenciamento e IPVA e também do seguro
obrigatório DPVAT, que deve ser um dos principais interessados em reduzir a
sinistralidade do trânsito. Além disso, o Ministério da Saúde poderia bancar
parte dos custos de campanhas de conscientização, tanto pelos benefícios à
saúde proporcionados pelo uso de bicicleta, quanto pelos custos envolvidos no
tratamento de fraturas e lesões por colisão e atropelamentos.
Comentários