GREVE DE CAMINHONEIROS E A REVOLTA CONTRA A LEI DA OFERTA E PROCURA

Por Fernando R. Ferro
Seguindo a linha do último texto, temos nesta semana que se inicia notícias advindas da paralisação dos caminhoneiros e as consequências para o país. Em cidades como Foz do Iguaçu, a paralisação dos caminhoneiros levou a planos de contingenciamento no abastecimento de aeronaves e fez com que o preço da gasolina nos postos se avizinhasse dos R$ 5,00 o litro. Outra consequência foi afetar a produção de indústrias que dependem da movimentação pelas estradas, como o abate de animais, e também atrasar a colheita da safra, que não tem como ser transportada.
O protesto dos caminhoneiros decorre de uma revolta contra a redução do preço dos fretes, que acumula cerca de 30% de baixa em algumas rotas desde o ano passado. Essa redução é fruto de duas medidas que foram amplamente aprovadas pela categoria, mas ao mesmo tempo causou temos nos compradores de frete. As medidas são a Lei do Caminhoneiro, que visou a redução do tempo máximo permitido de direção, e a implantação do agendamento para entrega de cargas nos portos. As duas medidas, a princípio, foram temidas como geradoras de custos e temia-se que poderiam aumentar o preço dos fretes. No entanto, seu efeito foi o contrário, organizando o caótico setor de transporte rodoviário, que opera no Brasil em regime de concorrência perfeita.
A consequência imediata foi que, mesmo em cenário de aumento de custos, o preço do frete vem caindo acentuadamente. Além disso, novas pressões competitivas se anunciam no horizonte rodoviarista. A principal delas é a abertura de novos trechos ferroviários, já que alguns pedaços da Norte-Sul começam a ser entregues depois de mais de 30 anos de obras, superfaturamentos e atrasos consecutivos.
Os caminhoneiros acreditam, no entanto, que por meio de protestos poderiam elevar o preço do frete. Ou ainda, querem que o governo, sempre o governo, adote medidas que protejam o setor. Uma delas é a prorrogação do prazo para o pagamento das parcelas do financiamento do FINAME, que já é subsidiado, uma vez que seus juros não chegam a 6% ao ano, negativos, portanto, uma vez que se desconte a inflação. Outra é a redução, via subsídio, do preço do principal insumo, o diesel. Outro absurdo, obviamente.
O setor de transporte rodoviário é amplamente subsidiado no Brasil, o que levou a uma distorção sem precedentes. Aqui o caminhão é comparativamente barato, em relação a outros meios de transporte, como locomotivas, balsas, barcos, navios e aviões cargueiros. Além disso, temos uma das maiores indústrias de caminhões do mundo, enquanto nossa indústria naval é capenga, mal atendendo a demanda da Petrobrás por navios e plataformas. O crédito é farto e subsidiado a taxas negativas, sendo que qualquer autônomo tem acesso a linhas para a compra de caminhões. Os consórcios são outra forma que garantem a compra acessível de caminhões, com parcelamentos longos. Desta forma, o setor é inundado de concorrentes, muitos dos quais acabam operando abaixo da linha mínima de retorno do capital empregado. O paradoxo é que em algumas épocas do ano há falta de motoristas, uma consequência indireta do excesso de autônomos e da elevada dependência do transporte rodoviário.
Não há em nenhum outro setor da cadeia de transporte algum tipo de intervenção tão grande por parte do governo para fomentar a competição como no transporte rodoviário. No setor de ferroviário predominam os monopólios regionais, e a indústria é composta de uns poucos fabricantes de vagões. Grande parte das locomotivas são importadas a preço de ouro. No setor naval, a importação de embarcações é proibitiva e o acesso a financiamentos é muito específico, impossibilitando que qualquer empresário se arrisque no setor como ocorre no meio ferroviário.
No caso do segmento naval pesa ainda a desoneração de impostos sobre os combustíveis na navegação de exportação, que não ocorre na navegação de cabotagem, o que faz com que seja muito mais caro uma viagem entre Paranaguá e Santos, em termos de custo de combustível, do que entre Paranaguá e Montevidéu, apesar da distância muito superior. A burocracia para cabotagem é outro entrave: exige-se para cabotagem muito mais documentos que para o transporte rodoviário. Assim o trigo argentino que vai de navio até Natal chega mais em conta que o trigo paranaense, que acabaria indo de caminhão.

Ou seja, apesar de tudo, os caminhoneiros ainda operam com fretes elevados, se considerarmos todas as ineficiências que impedem o desenvolvimento de alternativas mais racionais como a cabotagem e o uso de ferrovias. A revolta deles contra o livre mercado pede uma solução que só agravaria o problema: subsídios reforçariam a cadeia de vantagens do transporte rodoviário, acentuando no médio e longo prazo a tendência de baixa nos preços e incentivando a entrada de mais competidores. Afinal de contas, tudo que é subsidiado aumenta de quantidade. Se tivermos subsídio aos caminhoneiros, mais caminhoneiros haveremos de ter. E quanto mais caminhoneiros, menor o preço do frete. Fogo morro acima, água morro abaixo e a lei da oferta e da procura, amigos caminhoneiros, não há quem segure!

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