JOGOS VORAZES E A METÁFORA POLÍTICA


Por Fernando Raphael Ferro de Lima
Resultado de imagem para jogos vorazes            Há umas duas semanas fui inquirido por minha filha adolescente a assistir Jogos Vorazes (Hunger Games, Lionsgate), trilogia cinematográfica adaptada da obra homônima de Suzanne Collins. Confesso que minha reação inicial foi de apreensão. Sou do tempo em que uma boa história épica tinha anões, elfos e hobbits, além de criaturas horrendas do mal, sempre com nomes estranhos.
            No entanto, o filme é melhor do que parece pelo título, com um desenrolar político como tema de fundo. A história se passa numa nação chamada Panem, num futuro pós-moderno, pós-apocalíptico, em que a Capital domina por meio de uma cruel tirania 12 distritos, dos quais tira tudo que necessita. Em que pese a riqueza e tecnologia da capital, com seu estilo de vida luxuoso, os 12 distritos vivem na miséria.
            O enredo em si é meio bocó, com a história de uma garota e um rapaz que são obrigados a participar dos jogos vorazes, em que apenas um pode sair vencedor, que ocorre anualmente. No primeiro filme, os jogos estão na 74ª edição. O vencedor torna-se um garoto propaganda da capital. A simbologia dos jogos é que eles foram criados para apaziguar o sentimento de vingança dos distritos, que haviam se rebelado contra a Capital e perdido a guerra há exatos 74 anos. O 13º distrito havia sido varrido da terra.
            O segundo filme e o terceiro filme, que fica dividido em duas partes, dão sequencia a história, que contém todos os elementos para agradar o público adolescente: cenas de ação, romantismo, e muita pirotecnia tecnológica. Mas o ponto que quero discutir é o da metáfora pela luta pelo poder.
            No último filme, que é a parte 2 do terceiro livro, pelo que entendi, o 13º distrito consegue incitar a revolta em todos os outros 12 distritos e marchar em direção à capital. A promessa da “presidente” dos rebeldes é de que assim que conquistado o poder serão realizadas eleições livres, para por fim a ditadura do Presidente Snow.
Algumas cenas do final são muito interessantes: Snow determina que todos os habitantes da capital sitiada evacuem suas casas e dirijam-se ao palácio presidencial. No entanto, quando estão todos agrupados para entrar no Palácio, uma aeronave com a insígnia da Capital despeja bombas sobre os civis. Isso quebra definitivamente o moral das tropas restantes, e Snow perde a guerra.
Obviamente, o ditador não seria maluco a este ponto, e o que ocorre de fato é o bombardeamento dos civis pelo comando dos rebeldes. A presidente Alma Coin, finda a guerra, declara-se presidente interina, por tempo indeterminado, e propõem o retorno dos Jogos Vorazes como forma de aplacar a sede de vingança do povo dos distritos. Aí ocorre a reviravolta que dá fim ao filme e à história.
Em alguns aspectos, a trama parece inspirada na revolução russa; em outros, na revolução francesa. Em certa medida, dá a ideia de que as revoluções não fazem mais que trocar os tiranos, a um custo muito elevado em vidas humanas. A democracia, instaurada ao final, é antes um acidente, um deus ex machina imposto por um único indivíduo que usa sua mira para mudar a história. E a democracia, no fundo é só um método pacífico para a troca regular de tiranos.

Li em Mario Ferreira dos Santos que as revoluções são como Saturno, pois devoram seus próprios filhos. Hunger Games passa exatamente esta impressão, o que é um grande mérito para um filme focado no público jovem. Também da um sentido muito grande à luta pela liberdade, por mais que esta liberdade signifique o risco de perder o conforto e pouco que temos. Mas não se luta pela liberdade em si; luta-se pelo ideal de ver o fim das mortes sem sentido impostas por um Tirano.

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