ENGENHARIA DE TRÁFEGO A BASE DE TINTA GUACHE

Por Fernando R. F. de Lima.
           
         Não sei precisar onde nem quando começou a estranha mania de tentar resolver complexos problemas viários com tinta, mas em Curitiba a modo pegou nos últimos 10 anos. Desde então, esta parece ser a solução definitiva para tudo. Na gestão atual, do pedetista Gustavo Fruet, aliado ao PT, as mais recentes ações passaram por uma caricatura do que fez Haddad em São Paulo (sem sucesso, é bom dizer), na tentativa de agilizar o transporte coletivo da cidade.
            O local mais afetado foi o bairro Alto da XV, em que as ruas Marechal Deodoro e XV de novembro receberam nova pintura e uma de suas faixas passou a ser exclusiva para o tráfego de ônibus. Certamente algum ganho de velocidade nos coletivos deve ter sido observado, o que é bom para quem anda de ônibus, mas terão estas medidas efeitos reais sobre a melhoria da capacidade do transporte coletivo?
            A resposta, obviamente, é um sonoro não. Isto porque a frequência dos ônibus não aumenta quando cresce sua velocidade média. Ainda mais porque o aumento na velocidade média é relativamente desprezível, uma vez que a liberação da faixa aumenta a velocidade de deslocamento entre os pontos de ônibus, mas as acelerações e desacelerações continuam existindo. Assim, de uma média de 15 a 17 km/h tem-se um ganho para 19 a 20 km/h, o que para o usuário pouco significa. Para o motorista, por outro lado, a redução de um faixa de tráfego causa um estrangulamento significativo do tráfego, estendendo os horários de pico de tráfego.
           Mas no trecho em que foram criadas as faixas exclusivas para ônibus, a distância é de 2,6 km de faixas exclusivas. Os automóveis, atualmente, estão percorrendo estre trecho, fora do horário de pico, a uma velocidade média de 15 km/h (10 minutos). Neste trecho circulam, grosso modo, três linhas de ônibus (Detran/Vicente Machado, Tarumã e Alto tarumã), que levam os mesmos 10 minutos para realizar o trajeto. Só há uma diferença.
Antes da faixa de ônibus, os carros percorriam o trecho a uma média muito superior, de aproximadamente 25 km/h, semelhante à média da Rua Ituapava. Esta perda de velocidade do transporte individual não adicionou velocidade ao transporte coletivo. E mesmo que o tivesse feito, elevando a média de 15 para 20 km/h, ainda assim a influência no tempo de viagem teria sido desprezível, de apenas 2’:36’’, porque o trecho é muito curto. Este medida, portanto, só teve mesmo o impacto de imagem, porque efeitos práticos são nulos no que diz respeito a qualidade e velocidade na viagem de transporte coletivo. Já no transporte individual, o impacto foi severo, e mal digerido, porque mesmo em horários absolutamente normais, como três da tarde, o trânsito tornou-se complicado no binário XV de novembro Mal. Deodoro.
FAIXAS PARA BICICLETAS (Um vídeo engraçado sobre o problema)
Outra medida, recebida com bastante polêmica e entusiasmo, foi a pintura de faixas para bicicleta na borda lateral das faixas para automóveis na rua sete de setembro. No caso, as faixas de rolamento eram muito largas para o tráfego de apenas um veículo, mas demasiado estreitas para que dois carros trafegassem lado a lado. A gestão atual da prefeitura aproveitou para pintar faixas para ciclistas no lado direito da pista.
A iniciativa, a princípio, pode ser tomada como boa, sem grandes impactos sobre a circulação de veículos. Mas como nada é perfeito, duas medidas deixaram a iniciativa incompleta: a falta de sinalização vertical mais constante ao longo da via, para alertar, conscientizar e informar motoristas e ciclistas de que a faixa é para bicicletas e a falta de sinalização volta para os ciclistas, para informa-los de que, assim como os demais veículos, devem respeitar os sinais de trânsito, incluindo as faixas para pedestres.
Como a movimentação de ciclistas é pequena, o desrespeito destes neófitos não chega a ser tão preocupante, mas é notório que eles se imaginam acima das leis (humanas, divinas e da natureza), porque muitos simplesmente avançam o sinal o vermelho ou tocam por cima dos pedestres sem cerimônia (tampouco equipamentos).

Não sou, como já disse, contra medidas que favoreçam o uso de bicicletas ou o transporte coletivo. Ao contrário: acho que são medidas necessárias para melhorar a qualidade de vida das cidades. No entanto, transporte coletivo e ciclismo são atividades que devem ser levadas a sério, e não serem apenas expressão de programinhas político-partidários. Para fazer engenharia de tráfego é necessário mais que um balde de tinta e boa vontade.

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